PEUC e IPTU Progressivo no Município de São Paulo


Autor: Gabriela Gonçalves Barrense Lima - De Vivo, Whitaker e Castro Advogados / Data: 18 de novembro de 2014
Os proprietários de até 15 (quinze) módulos fiscais situados em faixa de fronteira poderão ter seus títulos legalizados, de forma definitiva, com base no projeto aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) no último dia 5 de novembro desse ano.  Cada módulo varia de 5 (cinco)  a 110 (cento e dez) hectares, de acordo com o município, e a faixa de fronteira é definida pela Constituição como até 150 quilômetros de largura, ao longo das divisas com os países vizinhos.

O texto aprovado condiciona à aprovação do Congresso Nacional, a ratificação dos registros imobiliários referentes a áreas com mais de 2,5 mil hectares – dispositivo que, na verdade, repete o previsto no artigo 188, parágrafo 1º, da Constituição e revoga a Lei 9871/1999.

Nos termos da lei revogada, caberia aos proprietários enviar ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), dentro do prazo de 2 (dois) anos, um requerimento de ratificação a fim de tornar o título definitivamente legalizado. Decorrido esse prazo sem o pedido do interessado, ou não podendo ele preencher todas as exigências previstas em referida lei, o INCRA passaria a estar autorizado a cancelar o título e registrar o imóvel em nome da União.

A Prefeitura do São Paulo iniciou, na última semana de outubro, o envio de notificações aos proprietários de imóveis tidos como ociosos para que parcelem, construam ou deem uso racional ao bem, sob pena de em não o fazendo no prazo lá estipulado, sofrerem um aumento progressivo do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) ou ainda se sujeitarem à efetiva perda da propriedade do imóvel.

O Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios (PEUC) são um dos principais instrumentos trazidos pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 2001) na busca pelo cumprimento da função social da propriedade. A aplicação desse instituto é trazida no Plano Diretor de cada município.  Em São Paulo, o último Plano Diretor foi publicado em 1º de agosto de 2014, e a função social da propriedade é trazida pelo 90, I, do referido instituto.

Há muito existe no ordenamento jurídico pátrio o instituto da função social da propriedade. Todavia, sua aplicabilidade é lenta, pois a busca por instrumentos que a tornem verdadeiramente eficiente é constante.

A Constituição Federal de 1998 encerrou a discussão histórica sobre a política urbana, que trazia, anteriormente, atribuições excessivas à União, em prejuízo da autonomia municipal. Determina, em seu artigo 182, que à municipalidade cabe a promoção de sua transformação e desenvolvimento, tendo em vista que a expansão urbana caminhou de encontro aos direitos fundamentais dos seres humanos e à preservação do meio ambiente. O Plano Diretor é o instrumento dessa comutação adequando-se, por óbvio, às normas gerais estabelecidas pela União.

A despeito da previsibilidade do PEUC nos Planos Diretores, bem como, no artigo 8º [1] do Estatuto da Cidade, não houve avanço em sua implementação.Isso porque, a redação do artigo supracitado pode levar a crer que a aplicação do PEUC é uma faculdade do município, cabendo a este, através de seu Plano Diretor, exercer ou não essa opção. Essa leitura é errônea, pois desconsidera o princípio da função social da propriedade, condição da legitimidade da propriedade. Ou seja, o município deve agir para que o princípio seja respeitado.

O imóvel urbano, nos termos do §2º do artigo 182 da Constituição Federal, cumpre sua função quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor [2]. O exercício da autonomia municipal se expressa através de um poder, que deve ser obrigatoriamente exercido, principalmente quando se trata de defesa de direitos fundamentais. Isto é, restando evidentes as condições objetivas, quais sejam, a excessiva valorização que dificulta o acesso dos economicamente desfavorecidos ou, ainda, a baixa oferta de imóveis no mercado, o município deve trazer o instrumento apto a reparar essa condição, sujeito à inconstitucionalidade por omissão.

O intuito do PEUC, segundo entabulado no Decreto, é estimular o desenvolvimento urbano e o aproveitamento adequado dos imóveis localizados no município.   Para tanto, e com base nos conceitos de imóveis não edificados e não utilizados constantes do artigo 92 do Plano Diretor determina, conforme abaixo, os prazos e condutas esperadas.  Por imóveis não edificados são entendidos aqueles com área superior a 500m² com coeficiente de aproveitamento utilizado igual a 0 [3]; como solo urbano subutilizado os lotes e glebas com área superior a 500m² com coeficiente de aproveitamento utilizado inferior ao mínimo definido nas zonas em que se situam [4]. Estabelece, ainda, que são considerados como imóveis não utilizados aqueles com coeficiente de aproveitamento igual ou superior ao estabelecido nas zonas em que se situam e que tenham, no mínimo, 60% de sua área construída desocupada por mais de 01 ano [5].

Assim, nos termos do Decreto, os proprietários de imóveis tidos como não edificados ou não utilizados deverão, dentro dos prazos abaixo descritos, providenciar o quanto segue:

i) 01 ano aos proprietários dos imóveis não parcelados, não edificados ou subutilizados, a contar do recebimento da notificação, para protocolo de pedido de aprovação e execução de projeto de parcelamento ou edificação do imóvel e de 02 anos para o início das obras, a contar da expedição do alvará de execução, tendo até 05 anos para conclusão o parcelamento do solo ou da construção; e

ii) 01 ano aos proprietários dos imóveis não utilizados, a contar do recebimento da notificação, para ocupação daquele, prorrogável pelo mesmo prazo, caso haja necessidade da regularização da edificação.

Caso as obrigações estabelecidas nas notificações não sejam cumpridas nos prazos determinados pela norma, a Prefeitura aplicará as alíquotas progressivas do IPTU, com o prazo limite de 05 anos consecutivos, até que seja atingida a alíquota máxima de 15%. A quota a ser aplicada será o dobro do valor daquela aplicada no ano anterior.
Decorridos os 05 anos sem que haja, ainda, a regularização da obrigação de edificar, parcelar ou utilizar, de acordo com o caso concreto, a municipalidade poderá prosseguir com a desapropriação do imóvel utilizando títulos da dívida pública como pagamento.

A notificação será procedida, inicialmente, nas Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS 2, 3 e 5, bem como nas áreas do perímetro da Operação Urbana Centro e da Operação Urbana Consorciada Água Branca, basicamente, a região central da capital. Até a presente data, 78 imóveis foram analisados pela prefeitura e considerados ociosos, conforme se verifica na lista divulgada [6].

Com a publicação do Decreto 55.638/14, adentra-se uma nova fase, em que a legalidade das construções do município será verificada ante o direito de propriedade. Todavia, muitos fatores ainda carecem de atenção. A demora no licenciamento, pendências jurídicas do imóvel, dificuldade na obtenção dos valores necessários para o aporte de capital, por exemplo, podem prejudicar o adensamento no prazo pretendido. Há de se ter ainda em mente que a criação de habitação social para os cidadãos de baixa renda requer financiamentos de alto custo e em grande escala e depende, também, do triunfo do Sistema Nacional de Habitação.

A especulação imobiliária, que ocorre quando o proprietário aguarda a valorização da região, acumulando dívidas com o poder público para poder vender o imóvel por um alto valor para as construtoras, poderá chegar ao fim, pois, diante do risco de perda do bem, as propostas deverão ser avaliadas com mais agilidade, sem que o erário seja prejudicado.

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